quinta-feira, 30 de junho de 2011

Lembranças de um Relicário

A sós no silencio da madrugada deixei-me envolver pelas recordações, afastando-me aos poucos daquele quarto para andar por entre as prateleiras do passado abrindo um ou outro dos inúmeros livros que elas continham.
Eram lembranças dos caminhos que percorri, dos sorrisos que espalhei, das lágrimas que derramei, dos amores pelos quais eu suspirei. Palavras e atitudes
Tudo aquilo estava diante de mim acompanhado de sensações experimentadas ao longo dos caminhos por onde vaguei. As lembranças se encontravam registradas em trexos aleatórios e tinham um certo poder de se deslocarem dos lugares. Momentos antigos que ficaram muito mais nítidos do que outro recentes, contam uma história ainda em andamento.
Talvez esse jeito bagunçado e fora da ordem cronológica seja a melhor maneira de contar a história de uma vida em cuja memória se encontram coisas eternas, guardadas em um relicário

Por: Priscila da Paz
 

Quero um amor pra vida inteira.


“Estava a lhe esperar,
comigo somente o desejo,
pois o medo,
este estava devorado...
mais uma vez, eu era,
o seu namorado...

Você chegou com sede,
o desejo muito presente,
eu caído em sua rede...
de uma maneira diferente...

Com suas armas carregadas,
não esbocei reação...
me deixei ser atacado,
totalmente em suas mãos...

Te deixei dominar,
lhe permiti açoitar,
mas no fundo, tinha certeza,
que embora aparente,
preso em sua armadilha,
Era você quem estava,
paralisada, presa em minha mira...”

Comunidade no orkut

Fresta

Em meus momentos escuros,
Em que em mim não há ninguém
E tudo é nevoa e muros
Quanto à vida dá ou tem.
Se, um instante, erguendo a fronte
De onde em mim sou aterrado,
Vejo o longínquo horizonte
Cheio de sol posto ou nado.
Revivo, existo, conheço
E, ainda que seja ilusão
O exterior em que me esqueço
Nada mais quero nem peço
Entrego-lhe o coração

(PESSOA, Fernando. Obra poética volume único. Pg. 177)

Noturno à janela do apartamento

Silencioso cubo de treva:
um salto, e seria a morte.
Mas é apenas, sob o vento,
a integração na morte.
Nenhum pensamento de infância,
nem saudade, nem vão propósito.
Somente a contemplação
de um mundo enorme e parado.
A soma da vida é nula.
Mas a vida tem tal poder:
na escuridão absoluta,
como líquido, circula.
Suicídio, riqueza, ciência...
A alma severa se interroga
e logo se cala. E não sabe se
é noite, mar ou distância.
                  

(Carlos Drummond de Andrade)

terça-feira, 28 de junho de 2011

Boca

Boca: nunca te beijarei.
Boca de ouro, que ris de mim
no milímetro que nos separa
cabem todos os abismos.


Boca: se meu desejo
é importante pra fechar-te,
bens sabes disto,
zombas de minha raiva inútil.


Boca amarga pois impossível
doce boca (não provarei)
ris sem beijo pra mim,
beijas outro com seriedade.

(Carlos Drummond de Andrade, Poesia completa pg. 1233)